domingo, 17 de maio de 2009

O NONNO

Imagine o quanto uma criança pode amar um tio capaz de transformar uma coisa tão banal quanto o momento de deixar de chupar chupeta num evento gigantesco, com direito a uma volta olímpica de despedida contornando a piscina e a uma cerimônia de cremação da chupeta na churrasqueira.

Ou um tio que inventa um treinamento de goleiro em que ele passa horas arremessando uma almofada redonda pra você voar pela sala fazendo defesas sensacionais e, eu devo admitir, tomando frangos espetaculares.

Ou um tio que chama você pra nadar pelado de noite, quando você já não sabia mais o que fazer pra se livrar do calor.

Pois essas são apenas algumas das farras inesquecíveis inventadas pelo meu tio Raul, que a família toda sempre chamou de Nonno.

Nessa época a gente morava em Piracicaba. Meu pai trabalhava aqui em São Paulo a semana toda, e ia pra lá pra passar o final de semana com a gente. Minha mãe fazia faculdade à noite e, pra não sobrecarregar meu avô, que ficava com o meu irmão, quase todo dia ela me deixava na casa dos meus tios. Normalmente minha mãe me buscava depois da aula, mas várias e várias vezes eu dormia lá mesmo, de mãos dadas com a minha tia, a Nonna.

Em 1981, depois de 5 anos piracicabanos, nós acabamos voltando pra São Paulo, e pouco tempo depois o Nonno e a Nonna se mudaram pra Santos. Obviamente o amor pelos dois não mudou nada, mas, como era inevitável, a gente passou a se ver muito menos.

Há pouco tempo, falando por telefone, eu disse a ele que ia lá pra Santos fazer uma visita. Ele deu risada e disse “uh, rapaz, vem nada, você só fala que vem e não vem nunca”. Aí foi a minha vez de rir, e eu disse que iria, sim, porque eu tava desempregado e finalmente andava com as tardes livres. Então ele contou que ia viajar, mas que em 15 dias eles estariam de volta, e que aí eu podia ir quando quisesse. Só que os 15 dias passaram, e aí passaram outros dias, passaram outras semanas, passaram outros meses, e eu acabei não indo.

E eis que nesse dia 14 o Nonno foi embora, animar a galera lá em cima. Deixando centenas de histórias pra serem contadas e milhares de exemplos a serem seguidos, além de um vazio imenso na Nonna, no casal de filhos, no casal de netos oficiais e nos milhares de netos não-oficiais, porque todo mundo, parente ou não, sempre foi um pouco neto do Nonno.

Tenho certeza de que ele não tinha dúvidas sobre o quanto eu o amava, mas não sei se ele tinha uma noção exata sobre o quanto eu vou ser eternamente grato pela participação que ele e a Nonna tiveram na minha criação.

Se eu soubesse que isso ia acontecer, teria ido lá pra Santos pra dizer pessoalmente. Mas eu não fui. Por isso essa vai ser a primeira coisa que eu vou dizer pra ele no dia em que a gente se reencontrar lá em cima. Já a segunda eu ainda não decidi qual vai ser. Mas, se estiver calor, provavelmente será um convite pra nadar pelado no meio das nuvens...

Fica com Deus, Nonno querido! E muito, muito obrigado por tudo.

4 comentários:

  1. Este comentário é pra dizer: "sem comentários". Bela homenagem.
    Muita força pra todos vocês, e um grande abraço.
    Fábio B.

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  2. Lindo texto (como sempre) e linda história que vocês construiram.
    Lamento muito, principalmente porque conheço essa sensação de ter perdido o momento de dizer o que deveria ter sido dito. A gente sempre acha que o certo era ter feito em vida.
    Mas tenha certeza de que seu tio agora sabe o que você queria dizer e até o que você jamais conseguiria ter dito
    Força aí, amigão! Grande abraço a todos.

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  3. Oi, Dudão... eu quero dizer logo, enquanto é tempo, e antes de que seja tarde... eu amo você, meu sobrinho querido! Tenho muito orgulho de ter colocado seu apelido, no mesmo dia em que você nasceu. Um beijão do tio Henrique

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  4. Brothers, valeu pela força! Tio, também te amo! Deixei uma mensagem pra você no Orkut!

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