terça-feira, 7 de abril de 2009

PAPO HIPOTÉTICO NO QUARTO DO FILHO DO SENADOR

Daí, né, o senador bate na porta do quarto do filho roqueiro. E o filho abre, golpeando o ar, como se fosse um lutador de boxe:

- Hey, papito, what´s up, meu?

O senador pisca. O filho roqueiro praticamente pode ver um dos neurônios do pai se esticando ao máximo para alcançar o outro, como um trapezista voando em câmera lenta pra agarrar a mão do parceiro. Aliás, pode-se dizer que se a vida tivesse fundo musical daria pra ouvir o tema de Carruagens de Fogo. Mas de repente algo ilumina o rosto do senador. A conclusão da sinapse é visível! E então ele diz:

- Éééé...

O filho sabe que agora é questão de tempo. Daqui a pouco seu pai vai conseguir dizer o que quer, mas o importante é que a parte mais difícil do processo já passou. Opa! Lá vem:

- ... éééé, desculpe incomodar você, meu filho, mas você sabe onde sua mãe está?

- Ué, acho que ela deve tá em casa. Num tá?

- Não está, eu já olhei em tudo.

- Não, papito, tô dizendo na casa dela.

O senador pisca. Duas vezes. E a voz dá uma discreta tremidinha quando ele pergunta:

- Qual casa dela?

- A casa pra onde ela foi depois da separação, papito!

O pai então arregala os olhos.

- Sep... Sepa...?

Desorientado, o senador tenta se abanar com o livrinho do Projeto Renda Mínima que tem em mãos, mas o livrinho cai, e como ele não percebe, fica mexendo as mãos na frente do rosto sem fazer vento nenhum. O filho põe as mãos nos ombros do pai:

- What´s up, old man?

O senador responde, desafinando de tão assustado:

- Depois da separação? Quem separou?

Agora é o filho quem pisca. Embora não seja nada inteligente, ele já vinha desconfiando que o pai talvez não tivesse percebido que não era mais casado. Mas decide que é melhor parar de poupá-lo.

- Como “quem separou”, papito? Você e a mamita.

- Eu e a ma... Eu e a Ma...?

- Yeah! Cê num tinha percebido?

- Se eu tinha per... não. Mas como? Quando? Por quê?

- Bom, desde...

- Alguém mais já sabe?

O filho suspira:

- Putz, papito, entra aqui que eu te conto. Vai, senta aí na minha cama. Só cuidado pra não sentar em cima do lagarto.

E então o filho conta tudo pro pai. Fala sobre o fim do casamento dos dois, fala do casamento da mãe com um argentino, fala da separação da mãe e do argentino, fala até da goleada da Bolívia na Argentina, mas o senador parece hipnotizado. Os dois permanecem em silêncio durante minutos, e tudo que se ouve é a respiração do lagarto. Até que finalmente o pai parece emergir lá do fundo, dizendo com a voz trêmula:

- Sabe o que eu não entendo?

- Tell me, papito, desabafa aqui com o seu filhão.

- Como é que uma mulher arruma tempo pra fazer tudo isso que a sua mãe fez sendo prefeita de uma cidade tão grande?

- Well, papito, a mãe num é mais prefeita faz tempo, né, meu?

O senador arregala os olhos, olha para o filho e levanta como se tivesse enfiado o dedo numa tomada.

- Porra, mas será possível que ninguém me conta nada?

3 comentários:

  1. HAHAHAHAHAHAHAAHAHAHAHAHA
    Duda, como é que vc pensa nessas coisas?
    eu adorei os neurônios trapezistas! quero eles pra mim! que fofos!

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  2. E eu quero ouvir a respiração de um lagarto! Rararará!

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